quinta-feira, 11 de novembro de 2010

O resultado das urnas, em 2010, particularmente no que tange à eleição para cargos no poder executivo, apontou algumas tendências e conclusões, dentre elas pode-se destacar algumas:

1) O gosto do brasileiro pelos ideais e pelas práticas de gestão pública dos partidos de centro e de esquerda. Por que digo isso? Porque o PSDB, que esteve à frente do governo federal, entre os anos de 1995 e 2002, é de centro com tendência para a esquerda. E o PT, que esteve à frente do governo entre os anos de 2003 e 2010 e continuará de 2011 a 2014, é um partido de esquerda. Nas disputas estaduais, juntos, PSDB, PT, PSB e PMDB elegeram 24 dos 27 Governadores. Tanto se falou sobre a falta de um posicionamento dos partidos e dos candidatos quanto a que lado eles pertencem e, de fato, defendem; se de fato são de esquerda, de centro ou de direita. Os eleitores parecem ter simplesmente ignorado essa dúvida e se posicionaram mais para a esquerda.

2) Esse posicionamento, a meu ver, é uma herança da filosofia da Constituição de 1988. Em seu âmago criou, em nós brasileiros, aquilo que eu chamo de “cultura da cobrança do direito”, em detrimento da “cultura do cumprimento do dever”. Há defensores dos direitos humanos, dos animais, do meio ambiente, dos trabalhadores, dos sem terra, dos sem teto, dos desalojados pelas barragens hidrelétricas, dos homossexuais, dos presos, dos cegos, dos surdos, dos mudos, das mulheres, das crianças, dos idosos, dos negros, dos analfabetos, dos indígenas, dos deficientes e de quem mais você conseguir imaginar. E para defender os direitos de todos esses existe um sindicato, uma ONG ou uma associação, devidamente constituída e financiada por alguém, em muitos casos, o erário público. É primordial que se garanta o direito de quem o tiver. O problema é que uma sociedade onde todos se obrigam, em todo momento e, principalmente, valendo-se do Poder Judiciário, garantir seu direito, está longe do verdadeiro ideal democrático. Uma sociedade verdadeiramente democrática e mais justa é aquela onde todos cumprem o seu dever, começando pelo Estado que, no Brasil, deve ser o réu com o maior número de ações correndo contra si na Justiça, em todos os níveis do Poder Judiciário. Para garantir todos esses nossos direitos, só no Estado do Paraná, segundo a OAB-PR, existem aproximadamente 38.900 advogados. Há, aproximadamente, um advogado para cada grupo de 264 pessoas. E para garantir o cumprimento do nosso dever, quais sindicatos, ONGs, associações ou órgãos públicos e privados existem? Será que existe em mesmo número? Pois numa sociedade onde todos cumprem o seu dever, ninguém precisa cobrar seus direitos. E não podemos nos esquecer que uma sociedade onde todos precisam cobrar seus direitos na justiça, vale mais o direito daquele que tem maior poder aquisitivo e influência, consequentemente, contratando os melhores advogados e se defendendo de forma mais positiva. Ou seja, a “cultura da cobrança do direito” é extremamente excludente, injusta e acaba sendo pouco democrática. Não tenho nada contra a esquerda. Penso que o importante num país do tamanho e da importância do Brasil é ter partidos de direita, de centro e de esquerda. Isso é extremamente salutar para o crescimento de nossa democracia e de nossa sociedade. Apenas chamo a atenção para a opção pela esquerda. Penso que a sociedade brasileira está optando pela esquerda numa visão muito imediatista e simplista. Olham-se os efeitos e se esquecem das causas. Enquanto não se resolverem as causas os efeitos não serão superados.

3) O presidente Luis Inácio Lula da Silva quebrou o protocolo e atirou ao vento a formalidade e a solenidade do cargo ao se transformar no principal cabo eleitoral da candidata do seu partido, escolhida por ele mesmo e colocada como a salvadora da pátria, algo característico de governos populistas, muito mais preocupados com seus próprios interesses que do povo que diz defender. A manifestação do seu voto e de sua vontade é um direito que ele tinha como cidadão. Como presidente da República ele tinha a obrigação de desejar o melhor candidato. O direito de escolher o melhor é dos eleitores.

4) O candidato derrotado no segundo turno das eleições pagou um preço alto por ter dispensado os ex-presidentes Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso como cabos eleitorais, de luxo, inclusive. Principalmente, Fernando Henrique Cardoso, que não ocupava nenhum cargo público durante a eleição e que, portanto, não tinha obrigações a cumprir por um cargo dado pelo povo e por um salário pago por esse mesmo povo que o presidente atual denomina como “tão sofrido”.

5) Em meu livro denominado Oportunidades, Negócios e Empresas, Editora Manole, 2010, à página 22, afirmo: “Há quem não admita e rejeite veementemente a tese de que a maioria da população brasileira é corrupta. E é verdade _ a minoria da população é corrupta. Só que a maioria é indiferente à corrupção e acaba, desse modo, transformando-se em um novo grupo: os que são coniventes com a corrupção.” O resultado das eleições mostrou isso claramente. Tudo o que foi falado sobre corrupção no governo do presidente Lula, foi simplesmente ignorado pela maioria da população. Devemos também lembrar que corrupção não é exclusividade do governo Lula. É um mal que nos acompanha desde a nossa formação. Como disse Jô Soares, certa vez e mais ou menos assim: “Corrupção existe em todos os lugares do mundo, o problema é que no Brasil existe, além da corrupção, a impunidade”.

6) O lugar reservado ao ´presidente Lula, na história, continua reservado, porém de forma arranhada, a meu ver. A História se encarregará de mostrar a oportunidade que ele perdeu de entrar para a História, de forma brilhante. Ele foi o primeiro líder sindical a chegar à presidente da República, o que demonstra um amadurecimento de nossa democracia e de nossa sociedade. Governou com tranqüilidade, renovou o mandato nas urnas e vai poder concluir seus dois mandatos, ficando 08 anos na Presidência. Recebeu a faixa presidencial de seu antecessor que, de forma elegante e, conforme manda o protocolo, anunciou seu voto, porém deixou a população escolher, de forma livre, democrática, sem pressões, sem o uso indiscriminado e disfarçado da máquina pública. O governo arrecada cerca de 36% do PIB, investe somente 2% do PIB e gasta o restante, portanto, 34% do PIB. Na China o gasto público está na casa dos 10% do PIB. A dívida pública brasileira deve fechar o ano de 2010 em torno de 42% do PIB. Esse gasto exacerbado camuflou a realidade da economia brasileira, neste ano de eleições. O presidente Lula cometeu o pecado grave da soberba. Sua popularidade foi usada para desdenhar de seus concorrentes e de quem o antecedeu. Tomou para si, e somente para si, todos os frutos colhidos por mudanças que o Brasil – e não somente os governos dos presidentes Fernando Collor de Melo, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso – implementaram entre 1990 e 2002. A tarefa árdua de plantar foi feita pelos governos que começaram as mudanças iniciadas com a abertura da economia, feita por Fernando Collor de Melo e digeridas pela sociedade, a um custo muito alto. O governo do presidente José Sarney foi um governo de transição. Fazer a transição de um governo militar para um governo civil, após 21 anos, já foi tarefa árdua demais. As pessoas mais esclarecidas e mais antenadas, como dizem os jovens, se aperceberão rapidamente que o presidente Lula exagerou ao querer colher tudo sozinho e o pior, querer dizer que os méritos são todos seus e de seu governo. É lógico que a capacidade que seu governo teve de manter as conquistas e saber dar continuidade é um grande mérito. Só que não precisa querer capitalizar sozinho os ganhos do trabalho.

7) A ministra Dilma Roussef não se elegeu presidente sozinha. Ela “foi eleita” pela popularidade do presidente Lula e pela sua imposição junto aos eleitores. Não quero aqui desmerecer sua vitória. Só afirmo que, em função de nunca ter exercido um cargo para o qual foi eleita, dificilmente seria eleita presidente da República sem o apoio do presidente Lula. Seu lugar na História também está garantido por ter sido a primeira mulher a vencer as eleições para presidente da República, no Brasil. Vamos aguardar para ver se não fará, ao presidente Lula, o mesmo que ele fez aos que o antecederam, ou seja, capitalizar para si o resultado do trabalho de outros. Em 2014 teremos eleições presidenciais novamente. Vamos aguardar para ver se a presidente eleita, Dilma Roussef, vai deixar o processo eleitoral correr naturalmente ou vai confirmar a tendência de alguns partidos políticos da América Latina em querer se perpetuar no poder, querendo ganhar as eleições a qualquer custo. Com certeza a sociedade e a democracia brasileira perderam com isso, pois o debate sobre nossos verdadeiros problemas fica prejudicado e sua solução mais prejudicada ainda.

Alfredo Fonceca Peris

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